Revista Golazzo #8 – Por essa ninguém ‘espeKVARA’

REVISTA GOLAZZO - DESFECHO CAMPEONATO ITALIANO 2023-2024
(Golazzo / Imagem: Facebook Napoli)

“Quem é Kvaratskhelia?”. Essa pergunta provavelmente foi feita por muita gente no ano passado, mas talvez ninguém tenha se perguntado de maneira tão duvidosa (ou até mesmo desdenhosa) quanto o autor desta coluna. É bem verdade que, antes da temporada 2022-2023 começar, não havia qualquer registro ou credencial disponível sobre o georgiano Khvicha Kvaratskhelia, mas mesmo assim.

Tanto é que, após ser oficialmente apresentado como reforço do Napoli, Kvara gravou seu primeiro vídeo para as redes sociais do clube azzurro ensinando torcida, imprensa e interessados a pronunciar seu nome de maneira correta. É fato: ninguém o conhecia. Relembre:







O vídeo foi gravado 11 meses antes da publicação deste artigo. A essa altura, a “dúvida” e o “desdém” devem ser substituídos por um pedido público de desculpas, ainda que a tal objeção tenha sido feita em tom espirituoso. Há talvez quem não saiba escrever Khvicha Kvaratskhelia, mas seguramente todos o conhecem e o reconhecem. Aos fãs de estatísticas, foram 34 jogos de Serie A (de 38 possíveis), com 12 gols marcados e 13 assistências. Aos fãs de premiações, ele foi eleito o MVP do campeonato italiano 2022-2023. Ou seja, o melhor jogador do torneio.

Kavra acabou por superar toda e qualquer expectativa. Afinal, não é que não havia expectativas. A avaliação prévia estava abaixo disso. O georgiano desembarcou num time que fracassou na conquista do scudetto passado e ainda “se livrou” de Insigne, Mertens e Koulibaly – a base de tudo até então. Sua chegada acompanhou a apresentação de Kim Min-Jae, que tinha um status ainda pior e acabou em desfecho semelhante ou quase idêntico.

O fato é que a temporada do futebol italiano apresentou um desfecho tão incomum quanto a própria escrita original do nome de Kvaratskhelia em sua língua nativa (ხვიჩა კვარაცხელია). Faça a reflexão por um instante: antes da temporada começar, você esperava ver o Napoli campeão da Serie A novamente depois de 33 anos? Ou então observar três representantes do calcio atingirem finais de Champions, Europa e Conference League? Ou ainda que Serie A teria uma pós-temporada com direito a final de 90 minutos valendo salvação e/ou rebaixamento?

No regulamento extraoficial do campeonato italiano, cada equipe pode estampar uma estrela acima de seus escudos para cada 10 títulos conquistados. A Juve tem mais de 30, logo, possui 3 estrelas. Para a temporada que acabou de acabar, Milan e Inter (ambos com 19) estavam ansiosos e preparados para estampar o segundo astro amarelo acima de seu emblema. Novamente, ninguém contava com a estratégia de Spalletti (até então nunca campeão de Serie A), os gols de Osimhen, a segurança de Min-Jae e… Kvatskhelia, lógico.

O desembarque do georgiano na Itália representou nova troca de mãos em cima do scudetto. Depois de 9 anos de Juventus, seguidos de rossonero e nerazzurri campeões, chegou a vez do Napoli, mas não apenas isso. A construção atípica do título serve de instrumento para perceber que o campeonato italiano segue exibindo novos motivos para receber atenções. A qualidade é indiscutivelmente inferior ao observado em outras ligas. Mas há coisas que acontecem quase somente na Itália.

Na mesma temporada, mesmo diante de virtudes limitadas, o futebol italiano colocou Inter, Roma e Fiorentina em finais de Champions, Europa e Conference League. Alguém esperava? Muitos torciam, mas alguém esperava? Dificilmente. O trio acabou perdendo cada uma das decisões, deixando surpreendentemente uma reação mais doce do que amarga em muita gente. A explicação que vem à mente em primeiro lugar é precisamente a quase nula expectativa para que a final fosse alcançada antes de qualquer coisa. Se bem que basta ver os caminhos trilhados pelas equipes italianas para balancear a receita e atingir um resultado mais agridoce. Até a decisão, a Inter precisou superar Porto, Benfica e Milan, além do Manchester City. Já a Fiorentina eliminou Braga, Lech e Basel até encarar o West Ham. O saldo realmente foi mais doce que amargo?

Mesmo depois de tudo isso, de todo o ineditismo para os fãs mais jovens do futebol italiano, a temporada foi capaz de gerar eventos oficiais e essenciais mesmo depois das 38 rodadas. Logo na primeira edição desde a mudança no regulamento, a exemplo dos já conhecidos playouts da Serie B, na qual dois times fazem uma espécie de final para indicar quem fica e quem é rebaixado, a elite do calcio precisou decidir o último clube condenado ao rebaixamento quase duas semanas após a 38ª rodada. Os 31 pontos que Spezia e Hellas Verona somaram ao fim da “temporada regular” os credenciaram para um jogo extra e em campo neutro. Ou seja, uma “final de campeonato” em pleno torneio de pontos corridos. E teve de tudo: 4 gols marcados, jogador expulso após evitar gol com a mão, pênalti marcado, pênalti perdido. Tudo. O último capítulo premiou o Hellas Verona.

O ciclo 2022-2023 acabou por reforçar a capacidade do futebol italiano de entregar entretenimento mesmo na base do fator surpresa. Mesmo no absentismo de grandes contratações ou durante nova crise na seleção italiana, os holofotes voltaram para a terra do calcio, ainda que momentaneamente e sem perspectivas para repetição (já não duvido mais). A Serie A foi mais longa do que o previsto, mais internacional do que anos anteriores e mais azzurra do que nunca. Por tudo isso, provavelmente ninguém esperava.







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