Quem defendeu Kaepernick precisa engolir Felipe Melo e Bolsonaro?

Em fevereiro de 2018, Tiago Leifert usou uma coluna na revista GQ para polemizar sobre a relação entre eventos esportivos e atos de cunho político. Aos leitores de manchetes, ele disse “Evento esportivo não é lugar de manifestação política“. Aos leitores leitores, aqui está o texto completo.

No artigo, o apresentador da rede Globo opina que, embora a causa de Colin Kaepernick seja até de coesa adesão, sua manifestação seria imprópria.O motivo? Para Leifert, o então jogador do San Francisco 49ers estaria vestindo uma camisa que não é dele. Ou seja, ele estaria usando uma posição privilegiada para expor uma opinião que é apenas sua, e não do time, dos jogadores e, mais importante, dos torcedores. Afinal, muitos deles poderiam discordar dele, certo?

Para quem não sabe, Colin Kaepernick encabeçou um protesto na liga de futebol americano. Assim como ele, outros jogadores passaram a ajoelhar justamente na hora do hino nacional. A ação servia para chamar atenção da sociedade para a violência imposta contra os negros nos Estados Unidos. A atitude irritou profundamente o presidente Trump e os conservadores amantes do esporte, que consideravam um desrespeito ao hino.

Com o perdão da contradição, tanto Leifert quanto Kaepernick estão corretos. Ora, quem em sã consciência diria que um atleta está errado por protestar contra a violência? Ou contra o racismo? Simples: pessoas violentas e racistas, que existem e, recentemente, têm ganhado voz mais ativa.

À época da publicação do artigo, Tiago Leifert foi massacrado massivamente. Os descuidados, como eu, acreditavam que ele estaria contra o movimento de Kaepernick e, logo, a favor de Trump e da onda conservadora. Não! Ele apenas teve o “azar” de usar um exemplo com apelo público. Mal sabíamos que o melhor exemplo para questionarmos a relação de esporte e política viria 8 meses depois.

Na última rodada do campeonato brasileiro, Felipe Melo, que na Serie A jogou por Fiorentina, Juventus e Inter, voltou a criar polêmica. Desta vez, sem ao menos ser perguntado sobre o tema, dedicou um gol a Jair Messias Bolsonaro.

“Agradecer a Deus pelo gol, à família. Esse gol foi para o nosso futuro presidente Bolsonaro”, comentou o jogador ao fim da partida, ainda em campo, vestindo a camisa do Palmeiras.

Menos de 24 horas depois do ocorrido, o Palmeiras emitiu uma nota (veja aqui), na qual diz permitir toda e qualquer manifestação política e religiosa, mas que ela expressa somente o pensamento do atleta. E não da instituição.

Fim do assunto?

Bem, como aponta o título desta coluna, Felipe Melo e Kaepernick estão unidos pela mesma causa. Óbvio que um é a antítese do outro. Mas a causa não seria a ideologia, e sim  o “direito” de se manifestar politicamente dentro do esporte. Ainda que seja para cometer a incompreensível loucura de defender ou promover alguém como Bolsonaro. E sim, se você aplaudiu a atitude de Kaepernick, é preciso ao menos permitir que Felipe Melo fale.

No caso do brasileiro, uma nota bastou para, não esclarecer, mas colocar os pingos nos “i’s”. Por outro lado, Kaepernick acabou dispensado do clube e está desempregado desde então. Por provável medo de retaliação, nenhuma equipe quis contratá-lo.

O perdão para um e a condenação para outro diz muito sobre a atualidade.

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