Acerbi x Juan Jesus: campeonato italiano não vê racismo por ‘falta de provas’

acerbi juan jesus campeonato italiano não vê racismo
(Reprodução / Youtube)

O campeonato italiano determinou que não houve racismo no caso entre Francesco Acerbi e Juan Jesus, encerrando as investigações, portanto, sem a aplicação de qualquer suspensão ao jogador da Inter. A decisão saiu em comunicado oficial da Serie A nesta terça-feira, 26 de março.

Em uma longa sequência de parágrafos, o documento detalha o procedimento aplicado desde a existência da primeira denúncia emitida pelo atleta do Napoli. O texto menciona toda a ação executada pela justiça desportiva, cuja investigação dos fatos incluiu todo o relatório do diretor da partida realizada no San Siro, as anotações do árbitro, mas principalmente as imagens da discussão entre Acerbi e Juan Jesus, além dos áudios gravados entre os membros presentes na cabine do VAR.

A decisão lembra ainda que a suposta ofensa racista “parece ter sido ouvida somente pelo ofendido (Juan Jesus), sem ser percebida pelos outros jogadores em campo, pelos árbitros ou pelos representantes do Ministério Público”.

Leia o trecho do documento:




Constatou-se que a sequência de acontecimentos em campo, reconstruída com base nos documentos oficiais, com a ajuda do Diretor de Jogo e em qualquer caso visível em vídeo, necessariamente a partir do jogo e do ato de expressão de algumas palavras de Acerbi para Juan Jesus, é certamente compatível com ofensas diretas, além disso, não de forma flagrante (ou seja, de forma a não ser percebida pelos outros jogadores em campo, pelos árbitros ou pelos representantes do Ministério Público), pelo jogador da Inter, e não ignorado em seu teor ofensivo e ameaçador pela mesma “ofensa”, cujo conteúdo discriminatório, porém, sem que por esta razão a boa fé do jogador do Napoli é posta em causa, parece ter sido percebida apenas pelo jogador “ofendido” (Juan Jesus), portanto sem o apoio de qualquer prova probatória externa, seja ela de áudio, vídeo ou mesmo testemunhal.

Notou-se também que a conduta discriminatória, devido à sua natureza intrínseca de gravidade e intolerabilidade, ainda mais quando se refere a raça ou cor da pele ou religião da pessoa, deve ser sancionado com a severidade máxima, de acordo com o Código de Justiça Desportiva e regulamentos
eventos desportivos internacionais, mas é, no entanto, necessário, e por maioria de razão, que a imposição de sanções tão onerosas seja correspondentemente apoiada por uma quantidade mínima de evidências, ou pelo menos evidências sérias, preciso e consistente, a fim de alcançar uma certeza razoável a este respeito.

Portanto, considerando que neste caso não é atingido o nível mínimo de certeza razoável quanto ao conteúdo certamente discriminatório da infração cometida, não se aplicam as sanções previstas no art. 28 CGS em direção ao jogador de futebol Francesco Acerbi, da Inter.

Nota da Serie A



As reações de Juan Jesus e Napoli




Assim que o documento foi publicado pela Serie A, tanto Juan Jesus como o Napoli se manifestaram por meio das redes sociais.

O jogador foi o primeiro a fazer uma publicação, ou melhor, a trocar sua foto do perfil no Instagram. No lugar da imagem anterior, o brasileiro fez a atualização para um punho fechado apontado para cima. O gesto é típico e costumeiramente utilizado como símbolo por movimentos negros contra o racismo.




Juan Jesus foto perfil Instagram racismo Acerbi



Já o Napoli publicou uma nota intitulada “Eu estou com JJ”, que também foi utilizada como campanha nas redes sociais. O texto cita partes do documento emitido pela Serie A, seguido de contestações logo na sequência, sobretudo da parte na qual a decisão confirma agressões verbais de Acerbi a Juan Jesus, mas sem conotação racista.

O comunicado ainda reforça que deixará de endossar campanhas “de fachada” de combate ao racismo promovidas pela Serie A anualmente. Nesta temporada, aliás, a principal campanha da entidade foi novamente a produção de um ensaio fotográfico na qual jogadores e ex-jogadores vestem uma camisa customizada.

Leia a nota do Napoli:




O senhor Acerbi não foi sancionado. Neste ponto, o culpado deveria, por “justiça desportiva”, ser Juan Jesus, que teria acusado injustamente um colega. Não é razoável pensar que ele entendeu mal. O princípio da maior probabilidade de um acontecimento, amplamente visível a partir da dinâmica dos fatos e das suas desculpas em campo, que é levado em consideração na justiça desportiva, desaparece nesta frase.

Estamos atordoados. Além disso, se o que aconteceu em campo, como diz a frase, “é certamente compatível com a expressão dos insultos dirigidos… pelo jogador da Inter, e não ignorados no seu teor ofensivo e ameaçador pelo mesmo”, porque não impor alguma sanção?

Por que, então, a sentença diz “uma vez que a prova da infração foi certamente obtida”, nenhuma decisão foi tomada pela “justiça” desportiva nesse sentido para punir o responsável? Estamos ainda mais atordoados. O Napoli não irá mais aderir a iniciativas meramente de fachada das instituições do futebol contra o racismo e a discriminação, continuaremos a fazê-las nós próprios, como sempre fizemos, com convicção e determinação renovadas.

Nota do Napoli



Acerbi e Juan Jesus: relembre o caso




No domingo de 17 de março, Inter e Napoli empataram em 1×1 no San Siro, em jogo válido pela rodada 29 do campeonato italiano 2023-2024. Os gols do jogo foram marcados por Darmian e Juan Jesus.

No pós-jogo, o próprio zagueiro brasileiro relatou em entrevista que foi ofendido de forma racista por Acerbi. Em entrevista ao DAZN, Jesus disse que foi chamado de “negro”, mas que a situação foi resolvida em campo após o atleta da Inter pedir desculpas.

Assim que a entrevista foi ao ar, surgiram nas redes sociais imagens do momento no qual Jesus recorre ao árbitro da partida para delatar o ocorrido. Não é possível fazer a leitura labial para determinar o que foi dito pelo brasileiro, mas em dado momento ele indica o emblema da campanha contra o racismo, que está estampado na camisa de ambos os times.

Em outras imagens, é possível ver Jesus e Acerbi discutindo, seguido de um gesto do zagueiro nerazzurro apontado para Thuram, seu companheiro de equipe.







Ainda sem anúncio de investigação ou possíveis punições, restando apenas especulações dos jornais italianos, a Inter emitiu uma nota reconhecendo o ocorrido, mas afirmando que “reserva-se ao direito de consultar o seu jogador o mais rápido possível, a fim de esclarecer a dinâmica exata do que aconteceu na noite passada”.

Algumas horas depois do ocorrido, que segundo o próprio Juan Jesus estava “resolvida” em campo, novos acontecimentos reativaram o desentendimento. Até mesmo o técnico da seleção italiana, Luciano Spalletti foi perguntado a respeito e, em entrevista coletiva, disse ter entendido não se tratar de um caso de racismo.

A repercussão seguiu e o jogador brasileiro utilizou seu Instagram para reclamar da reinterpretação dos fatos, inclusive do próprio Acerbi.







Para mim o assunto foi encerrado ontem em campo com as desculpas do Acerbi e sinceramente teria preferido não voltar a algo tão repugnante como o que tive de sofrer.

Hoje, porém, li declarações de Acerbi que estão totalmente em desacordo com a realidade dos fatos, com o que ele próprio disse ontem em campo e com as provas também mostradas por vídeos e leituras labiais em que me pede perdão.

Então, não. O racismo é combatido aqui e agora.
Acerbi me disse “vai embora preto, você é só um preto”.

Após o meu protesto ao árbitro ele admitiu que tinha cometido um erro e me pediu desculpa, acrescentando depois: “para mim, negro, é um insulto como qualquer outro”.

Hoje ele mudou de história e afirma que não houve insulto racista. Não tenho nada a acrescentar.




O Golazzo também possui um canal no Youtube, onde estão sempre disponíveis vídeos com toda a cobertura do futebol italiano. Acesse o canal e faça sua inscrição:







Comentários

Comentários